Diálogos surreais

Repentinamente me recordei um diálogo surreal que tive com um magistrado

Falávamos sobre como é esse negócio de seguir carreira no serviço público e que nem sempre a magistratura é o topo da carreira e às vezes é mais um objeto de desejo.

O digno magistrado em dado momento se mostrou incomodado com uma fala minha. A resposta veio em tom ácido para defender que era aquela profissão que ele tinha escolhido e adorava tudo que fazia.

Reduzi a marcha a continuamos a prosear sobre amenidades.

Lá pelas tantas eu falei que lembrava de várias questões do meu início de carreira (sou concursado em uma área técnica) e que muita coisa era diferente na prática e isso me chamou bastante a atenção.

Perguntei se ele se lembrava da primeira sentença.

Resposta negativa.

Depois perguntei sobre as primeiras decisões importantes no começo de carreira.

Resposta negativa.

Daí perguntei se ele se lembrava de alguma sentença importante que tenha dado em toda carreira.

Resposta negativa (mas claro que com um perfume no argumento de que toda sentença é importante)

Tentei puxar na memória se teria alguma coisa que eu gostasse muito mas que não me lembrasse de nada…. não tive êxito. Tudo que eu gosto muito sempre me deixa marcas profundas. Posso até não lembrar num primeiro momento, mas logo em seguida algumas histórias fluem naturalmente a cada respirar.

A conversa com o magistrado continuou. Ele falou de viagens, compra de carros, restaurantes, aulas que ele deu em cursinhos, pessoas que conheceu, lugares em que foi convidado a falar, aulas magnas que proferiu em universidades…..

Falou de tudo mas nada disse sobre a profissão que disse que amava.

Respirei fundo por dentro. E pontuei que eu era muito feliz onde eu estava e do jeito que eu estava. Além disso, eu não guardo ego ou vontade de ser quem eu não sou ou estar onde não estou. Isso é coisa que se apaga a cada respirar ou a cada gota de água do mar. O vento leva essas baboseiras.

Acho que ali eu só ouvia ecos de alguma coisa que não estava bem resolvida. Ainda bem que os tropeços entre teoria e prática não estavam comigo.